Aspectos
jurídicos da Era Vargas e do Estado Novo
Eppur si muove!
Resumo:
Existiram tentativas de transformação do Poder Judiciário e do ordenamento
jurídico durante o Estado Novo[1]. A doutrina jurídica
centrada em juristas alinhados com o regime de Vargas apresentou seus
entendimentos sobre a administração da Justiça.
Palavras-chave:
Estado Novo. Poder Judiciário. Estado de sítio. Constituição Brasileira de
1937. STF.
Muitas
questões são relevantes como a questão da independência e da autonomia da
magistratura, o papel do Supremo Tribunal Federal, os limites do controle de
constitucionalidade, a reformulação da hermenêutica jurídica e a relação
existente entre Poder Judiciário e Poder Executivo. Os debates da Era Vargas no
que se refere aos esforços de controle e dominação da Justiça no
constitucionalismo autoritário então reinante.
O
constitucionalismo[2]
da Era Vargas paira numa incógnita sobre o que fazer com o Judiciário e o
próprio sistema legal e, desde a Revolução de 1930, existia tensão na relação
do Chefe do Governo Provisório e a elite judiciária do Supremo Tribunal
Federal. Aliás, tradicionalmente, a Corte Suprema era o locus naturalis
para pacificação de questões controvertidas e polêmicas, de cunho político da
República brasileira.
Foi
com o movimento revolucionário e suas mutações ocorridas entre 1930 e 1945, o
STF restou como protagonista a sofrer diversos influxos e fora redimensionado
através do golpe de Estado de 1937.
A
tensão sobre o que se fazer com a Justiça e o ordenamento jurídico não é
recente, basta lembrar da reação de repulsa dos revolucionários franceses
diante da magistratura do Ancien Regime, com as consequentes dificuldades em
basear um ordenamento jurídico sem confiança na magistratura.
Enfim,
o Judiciário varguista se apresentava num lugar próprio dentro das elites
tradicionais brasileiras e, não em um campo livre para haver ingerências por
parte dos revolucionários de 1930, até chegar à pulverização da Justiça nos
Estados da federação brasileira. Os ideólogos da época de Vargas sempre
sofreram grandes dificuldades em conquistar as diferentes ramificações da
Justiça e impor a hegemonia de Vargas nas esferas judiciais brasileiras.
O momento
histórico do país havia posto em segundo plano a clássica separação de Poderes,
e procurava-se uma nova forma de diálogo exclusivo entre o empoderado Poder
Executivo e o Judiciário. A ideia de
unidade da jurisdição surgiu como um
dos imperativos do regime em seu
momento mais duro.
Os quinze
anos de afirmação
política do varguismo,
destacaram-se algumas tentativas
de readequar a
Justiça à realidade
do Estado autoritário.
Mesmo o autoritarismo latente
de Francisco Campos admitia os obstáculos – teóricos e
práticos – de transformar o sistema legal e a
Justiça (CAMPOS, 1942).
Sua
acusação principal contra o sistema
jurídico brasileiro estava
centrada na convicção
de que a
Justiça democrática brasileira
anterior ao Estado
Novo apenas fomentava
a formação de
uma “atmosfera propícia
à conservação e
perpetuação de hábitos, ritos e tradições”, e que não
proporcionavam soluções às demandas coletivas,
pois ainda estavam
fundadas em “técnicas
de processos obscuros”.
A
remodelação do Supremo
Tribunal Federal, do
sistema jurídico e
do Poder Judiciário
abrangem uma série
de questões. Uma
das constantes do
regime foi a
tentativa de “alinhar”
o Supremo Tribunal
Federal à ideologia
oficial do Estado
(RODRIGUES, 2002), o
que significa ingerência
na composição da
Corte e a
reformulação profunda do
controle de constitucionalidade no
Estado Novo (MOURA,
1942).
Tais
questões envolvem, naturalmente, outro
debate extremamente importante: a polêmica em torno da independência do
Poder Judiciário e da autonomia da magistratura no Estado Novo.
Entre 1930
e 1945, houve a
criação de três
novos tipos de magistratura
especial, a Justiça
Eleitoral (1932), o
Tribunal de Segurança
Nacional (1936) (NUNES,
2014) e a
Justiça do Trabalho
(1941), cada uma
com características próprias
e naturalmente criadas
em contextos diversos.
Um dos
passos ousados dos intelectuais ligados
ao autoritarismo varguista
foi a tentativa
de estabelecer novos
métodos de interpretação
judicial antiformalistas, dissociados, portanto, do
que se considerava
como excesso individualista da
tradição liberal e
seu formalismo jurídico.
Tal empreitada está registrada nas obras de
doutrina, mas, ao final, permaneceu como edifício inacabado
da aventura autoritária.
Ou seja, o ideário antiformalista no
campo da hermenêutica
teve alguma penetração
naqueles anos, mas prevaleceram as dificuldades teóricas de pôr em
prática a “maleabilidade” hermenêutica.
Logo
que os revolucionários chegaram
ao poder em
1930 – dentre
eles muitos tenentes
que tiveram sucessivos habeas corpus
negados pelas Suprema
Corte em virtude
das revoltas de
1922, 1924 e
1927, houve a
aposentação compulsória de
seis ministros do
STF e a
diminuição geral dos
vencimentos. Foram exonerados
pelo Decreto n. 19.656, de 18 de
fevereiro de 1931, os ministros
Godofredo Cunha[3] (Presidente),
Edmundo Muniz Barreto,
Antônio Joaquim Pires
de Carvalho e
Albuquerque, Pedro Afonso
Mibieli, Pedro dos
santos e Geminiano Franca.
A
revolta dos magistrados do Supremo Tribunal
com a arbitrária
aposentação compulsória se
tornou célebre nos
textos de resistência
de Hermenegildo de Barros
(BARROS, 1941) e de Pires e Albuquerque (ALBUQUERQUE, 1931),
publicados originalmente nos
jornais de grande
circulação.
Em 25 de março de 1931, foi aprovado apenas mero
“voto de saudade”
pelos ministros remanescentes
pelo afastamento dos
seis que foram
demitidos da Corte.
Hermenegildo de Barros preferiu lavrar sozinho seu protesto contra a
arbitrariedade de Vargas.
Anos posteriores,
por ocasião da entrada em vigência
da Constituição brasileira de
1937, a idade
de aposentadoria compulsória
baixou de 75 (setenta e cinco) para 68 (sessenta e oito) anos,
ocasionando a situação de aposentadoria imediata para o
próprio Hermenegildo de Barros[4], Edmundo Lins[5] e Ataulfo de Paiva.
Observou-se
reações tão díspares diante da arbitrariedade do governo de Vargas Em 1937, o
Ministro Edmundo Lins cordialmente agradeceu os elogios recebidos dados por
Vargas, manifestando apreço por seus colegas do Tribunal com direito as
citações de clássicos gregos. E, o combativo Ministro Hermenegildo barros,
redigiu uma seca resposta para o Presidente da Corte, declarando que não mais
iria ao STF.
Enfim,
o Supremo Tribunal Federal acabou seguindo
a ideologia oficial,
inclusive comungando da
guerra contra os
inimigos da pátria,
notadamente o comunismo,
simbolizado pela Intentona
Comunista de 1935.
Nos
casos que envolviam a batalha
contra o internacionalismo comunista,
a marca da
Corte foi o
formalismo, não se
opondo à institucionalização das medidas de
combate aos inimigos do regime, mesmo que isso significasse seguir a Lei de
Segurança Nacional (1936), que recebeu a
alcunha de Lei
Monstro[6], redigida
por Vicente Ráo.
É fato
que o STF não possuía em sua plenitude as características que só veio adquirir
nas derradeiras décadas[7], de Corte Constitucional
dirigida para a concretização e efetivação de direitos fundamentais e, ainda, à
proteção das liberdades e garantias individuais.
Assim,
a Primeira República, o papel crucial do STF no sistema era o de domesticar as
infindáveis contendas existentes entre os membros da federação brasileira,
interferindo e mediando as questões como o estado de sítio e a intervenção
federal[8].
A
República Velha, também conhecida como Primeira República, é a primeira fase da
república brasileira e estendeu-se de 1889 a 1930. Esse período ficou
profundamente marcado na história brasileira por ter sido quando as grandes
oligarquias controlavam a política do Brasil por meio de esquemas de troca de
favores.
Esse
controle enfraqueceu-se na década de 1920, motivando grandes movimentos de
contestação. O resultado do enfraquecimento do sistema oligárquico levou à
Revolução de 1930, levante armado que resultou na subida de Getúlio Vargas à
presidência do Brasil.
A
criação do estado de sítio[9] ocorre no
constitucionalismo francês como forma de poder militar, mas logo passou a ter
conteúdo marcadamente político. E, decorre daí a distinção entre état de
siège militarie o effectif e o état de siège o politique[10],
ou, respectivamente: o estado de sítio militar ou real de um lado e, de outro
lado, o estado de sítio fictício ou político.
Ambos
foram teorizados e aplicados nos momentos posteriores à Revolução Francesa,
sendo que a principal diferença entre ambos é que enquanto o primeiro pressupõe
uma ameaça militar, no segundo basta uma ameaça política.
É
figura bastante controvertida e cujo principal questionamento reside na
tentativa de diferenciar um estado de sítio que sirva aos propósitos
democráticos de um uso no qual se serve das restrições impostas aos direitos
individuais para estabelecer ditadura.
Houve
ampla utilização do estado de sítio pela república brasileira nascente e pode
ser visualizada quando somente os presidentes Campos Sales, Afonso Pena, Nilo
Peçanha e Delfim Moreira não invocaram em nenhum momento esse instituto.
Entre
o período de 1891 a 1926, com destaque dado ao governo do Marechal Floriano
Peixoto, o Marechal de Ferro que foi quem primeiro usou do mecanismo e ao
governo de Artur Bernardes[11], quem mais utilizou o
estado de sítio, além de se valer de envio maciço ao campo de internamento na
fronteira da Guiana Francesa.
Seu
governo (1922-1916) tece incrível marca de 1.287 dias em estado de sítio, de
forma que não parece exagerado considerar que esse foi marcado pela
excepcionalidade[12].
A introdução
do controle judicial
de constitucionalidade das
leis no Brasil
estava muito mais
associada à necessidade de
manutenção das prerrogativas e
das competências constitucionais da União por causa do novo
modelo federalista.
A
noção de
imprescindível efetivação de
direitos individuais que
se tem hoje
não necessariamente refletia
o papel e
a índole do
Supremo Tribunal Federal
nos anos 1930 e 1940
(CONTINENTINO, 2018).
Por um lado, tinha-se
a defesa da
autoridade da Constituição (e
a preocupação com
o cumprimento das
decisões emanadas pela
Corte), que deveria
servir como foco
de legitimidade para
debelar momentos de
crise política aguda,
preservando a unidade
nacional e a
Federação.
A
força do Supremo Tribunal Federal advinha,
portanto, de marcar
posição dentro do
difícil equilíbrio com
Executivo e Legislativo. O
Tribunal Supremo certamente representava, durante a primeira
metade do século
XX, o elemento mais fraco e insipiente dentre os
três poderes. Com a dissolução do Legislativo, restou ainda mais fragilizada
a posição do
STF, e não
causa surpresa que a Corte tenha
jogado papel de subserviência e omissão durante o Estado Novo.
O
Supremo Tribunal Federal funcionou por décadas, essencialmente, como
última instância de
revisão. O lento amadurecimento
do controle de constitucionalidade
difuso[13] no começo da República
significou uma mudança de paradigma sobre
como o Brasil
enxergava sua Constituição.
Nos
anos 1930, quando emergiam
alguns consensos sobre
o papel da
Corte na domesticação
de questões políticas
e na estabilização
do sistema, houve
a ascensão de
doutrinas abertamente autoritárias
e a fragilização
do Poder Judiciário de um modo geral.
As inovações
do controle de constitucionalidade abstrato,
baseadas em Kelsen e na experiência austríaca, tenham sido recepcionadas
no Brasil nos
anos 1930, o
que prevaleceu foram
as novas formas
constitucionais autoritárias (MIRANDA, 1932).
Na
Constituição de 1937[14], o Parlamento Nacional
perdeu a competência
para legislar, ao
mesmo tempo em
que foi autorizado
a convalidar normas
julgadas inconstitucionais pelo
Supremo Tribunal, quando pedido pelo Presidente da República (art.
96, CF/37).
Foi instituído
verdadeiro “autocontrole” de constitucionalidade que,
para Araújo Castro,
era o “processo
de racionalização do
poder” da Constituição
de 1937 que
apenas atinge seu
acabamento “lógico” nas
“Constituições novas”, pois
o controle de
constitucionalidade das leis
era visto como
“garantia suplementar das
liberdades individuais”.
Como Getúlio
Vargas evitava a
todo custo a
institucionalização da própria Constituição de 1937, o “anticontrole”
não foi aplicado pelo Parlamento do modo que a Constituição previa, e sim
através dos tradicionais decretos do Presidente.
Havia o
apoio doutrinário de Francisco Campos
para a remodelação
do controle de
constitucionalidade. A acusação de
Campos era clara: não
cabia aos juízes
propalarem diferentes interpretações sobre questões que lidavam com interesses
primeiros da nação, uma vez que “a
interpretação não dispõe
de processos objetivos
e infalíveis”.
Ao Poder
Judiciário, portanto, não
caberia mais a
função de árbitro
irrecorrível da constitucionalidade, pois o processo de
transformação do mundo moderno, e seu
caráter eminentemente dinâmico,
era, na visão
de Campos, frequentemente obstado
por “uma interpretação
orientada por critérios
puramente formais, ou
inspirados na evocação
de um mundo
que já morrera” (CAMPOS, 2001a).
Sob a
interpretação, e dissimulados pela sua aparelhagem técnica e dialética, o
que existia, muitas
vezes, era uma
doutrina, um dogma,
ou um ponto
de vista preconcebido, ou
uma atitude filosófica em relação à vida econômica,
política ou social.
Acontecia,
assim, que, na frase de Oliver Holmes[15], os tribunais
transformavam a Constituição na
Estatística Social de
Spencer, lendo-a e
interpretando-a através dos seus preconceitos filosóficos.
Ora, a
interpretação não dispõe de
processos objetivos e
infalíveis e, por isto mesmo,
está sujeita à influência do coeficiente pessoal do juiz. Não há, portanto, nenhuma razão para aceitar
como decisiva ou
definitiva, no plano
em que se acham em
jogo os maiores
interesses da nação,
uma interpretação que
não dá nenhuma
garantia objetiva do
seu acerto.
Aos juízes
não será, em consequência, permitido, a
pretexto de interpretação constitucional, decretar
como única legítima
a sua filosofia
social ou a sua concepção do mundo, desde que essa filosofia ou
concepção obstrua os desígnios econômicos, políticos ou sociais do governo, em
benefício da nação (CAMPOS, 2001a).
O novo
controle de constitucionalidade do Estado
Novo tenha sido
implementado sem sequer
ser acionado o
Parlamento Nacional, em
mais uma demonstração da
precária
institucionalização dos preceitos
normativos da Constituição
de 1937.
O
corajoso voto do ministro Carlos Maximiliano, em mandado de segurança de
1939, simboliza a
hipertrofia do Poder
Executivo, e o
consequente enquadramento da
cúpula do Judiciário.
O caso em questão
é o MS
n. 623[16], relativo à incidência
de imposto de
renda sobre os
vencimentos pagos pelos
cofres públicos estaduais
e municipais, julgado
inconstitucional pelo Supremo
Tribunal Federal.
Ocorre
que o Decreto-Lei n. 1.564, de 5 de
setembro de 1939,
confirmou os textos
de lei decretados
pela União que
haviam sido declarados
inconstitucionais pelo STF,
deixando sem efeito
quaisquer decisões judiciais
em contrário. A elegante reação de
Carlos Maximiliano em seu voto
demonstra a posição
delicada e desconfortável a que
estava submetida a Corte.
Evocando
a frase célebre atribuída a Galileu Galilei no julgamento perante
o Tribunal do
Santo Ofício –
e pur si
muove (“e ainda
assim se move”) , Eppur si muove! E, contudo,
move-se. Segundo a lenda terá sido a frase murmurada por Galileu Galilei (1564
– 1642) após ter renegado a sua teoria heliocêntrica perante o tribunal da
inquisição. Seja a frase verdadeira ou não, certo é que o legado
científico de Galileu mudou o pensamento científico.
Maximiliano
deu o tom dramático da posição do Supremo Tribunal Federal na
separação de Poderes
do Estado Novo.
A
lógica de sua crítica seca era a de
que o
eclipse não nega
a existência do
Sol. Ou seja, para o jurista
gaúcho se tratava de
um momento em que a
concepção liberal do
direito se encontrava
em estado de
hibernação, até quando
durasse o processo
autoritário.
O fato
curioso é que Carlos Maximiliano
era egresso das
rígidas fileiras do
positivismo gaúcho[17], tendo
desempenhado uma série
de funções associadas
ao castilhismo, especialmente ligado
a Pinheiro Machado, enquanto sua história de vida
durante o Estado Novo foi marcada por independência de posições quanto ao
autoritarismo oficial.
O
positivismo gaúcho, de matriz castilhista, não foi aquele construído por Comte,
mas uma versão pragmática e instrumentalmente adaptada à realidade do Brasil e,
principalmente, do Rio Grande do Sul, com um poder executivo forte e dotado de
extensos poderes (ditadura republicana), com uma câmara de representantes que
era apenas um órgão de assessoramento encarregado de votar os tributos e o
orçamento, e liberdade de expressão restrita ou praticamente inexistente.
Tudo
para garantir a supremacia oligárquica dos estancieiros e a permanência
perpétua do Partido Republicano Riograndense (PRR) à frente dos destinos do
Estado.
Maximiliano
publicou “Hermenêutica e aplicação
do Direito” em
1925, obra que logo se tornou um
clássico da hermenêutica e da Teoria do Direito, estabelecendo as
bases da evolução
do campo no
Brasil ao enfrentar
uma série de
questões espinhosas.
A
terceira edição aumentada veio em
1941, contudo não
se verifica pendor
em direção às
diretrizes antiformalistas do
Direito, típicas do
autoritarismo entre guerras. Nomeado ministro do Supremo Tribunal
em 1936, Carlos
Maximiliano foi aposentado compulsoriamente em 1941, aos 68 anos de
idade, quando atingiu o limite de idade
previsto na Constituição de
1937 (MAXIMILIANO, 1925;
MAXIMILIANO, 1941).
Admitia-se
o caráter controvertido do novo controle das leis, mas era taxativa a negação à
tradição norte-americana do controle difuso, pois “a prática norte-americana não
adquiriu prestígio universal” (MOURA, 1942).
A exaltação ao plenipotenciário Chefe de Estado, portanto, era
notória: Carl Schmitt[18] foi mesmo entusiasta
do Chefe de
Estado, como guarda
da Constituição.
E, é notável
que o
eminente escritor haja
desenterrado do pó
dos arquivos, para
elogiá-lo calorosamente,
como cousa digna
de ser revivida,
o pouvoir neutre, intermédiaireou modérateur, preconizado por
Constant[19] e
acolhido pela Constituição brasileira
de 1824 e
pela Carta portuguesa
de 1826. Que muito é,
portanto, que o
Brasil haja instituído
uma guarda constitucional tríplice,
por parte do
Judiciário, do Executivo
e do Legislativo? (MOURA, 1942).
Carta de 10 de novembro era encarada como um
“sistema mixto”, ao mesmo tempo “rígida e
flexível”. A visão
que Almeida Moura
estava centrada em um novo mito
nacional, em que o Brasil, com a Constituição de 1937, estava a “sair de uma
nebulosa”, através da estruturação de uma nova ordem, “que pode não
ser tão esquemática
como as que
se descrevem nos
velhos compêndios”, mas que era “mais realista” e “mais consentânea com
o deslocamento, em favor
do Executivo, do
centro de gravitação
dos poderes políticos” (MOURA, 1942).
O
peculiar controle de
constitucionalidade
consagrado na Carta
de 1937 não
era necessariamente um
controle das leis
típico de um
regime autoritário. Sem
par no direito
comparado, o controle
de constitucionalidade feito
Parlamento poderia, naturalmente, possuir
formatação eminentemente democrática.
O controle
do controle de
constitucionalidade a ser
exercido pelo Poder
Legislativo acabaria por
representar emenda à
Constituição, ao negar
uma decisão do
Supremo Tribunal Federal,
e assim referendar
com firmeza um entendimento dos
representantes do povo.
Obviamente,
toda lei está inserida em
um contexto histórico
específico e, no
caso do contexto
autoritário do Estado
Novo, o novo
controle de constitucionalidade representava
o rebaixamento do
Supremo Tribunal Federal
como órgão político e sua subordinação ao Presidente da
República.
Ao despojar
o Poder Judiciário
de uma prerrogativa
que lhe era
essencial, Campos defendia
que a Constituição de
1937 conferia “ao
Parlamento é a
faculdade de remover
a inconstitucionalidade, mediante
nova votação da lei, o que equivale, praticamente, a emendar a
Constituição, tornando compatível com
esta a lei
impugnada”, quando se
tratasse de “interesse
nacional de alta
monta”. Seu realismo
dava mostras de
como ele enxergava
as engrenagens do
jogo político e
como assumia o
Estado Novo como algo efetivamente revolucionário.
Ao
negar a tradição norte-americana de
controle de constitucionalidade, na
verdade, estava execrando
o que ele
enxergava como o “governo dos juízes”, afirmando que nos Estados Unidos
a “ideologia conservadora encontrou, assim,
no Poder Judiciário, o
instrumento destinado a
moderar ou inibir
os ímpetos democráticos
da Nação. A
Constituição passava, por
um processo metafísico,
a incorporar a
filosofia dos juízes” (CAMPOS, 2001d).
Campos
in litteris: “essa filosofia,
que se confundia
com a Constituição, tornava-se filosofia
obrigatória no país”,
e “só era
constitucional a concepção
do mundo dos
juízes, o seu
ponto de vista
preconcebido em relação
à sociedade, aos
direitos individuais e
aos interesses da
nação”. É interessante
notar que no
pensamento campiano o
controle de constitucionalidade inspirado
nos norte-americanos era
visto como “artifício”,
que transferia o
poder “dos órgãos
de delegação popular
enxergava a Corte
Suprema como “órgão
que não se
origina do povo,
e que não
se encontra sujeito
à sua opinião”,
e Campos tinha
como alvo principal
atacar a “supremacia
do Judiciário”, que
na sua visão
estava apenas disfarçada
de “método jurídico”,
de “caráter puramente
lógico e objetivo”.
Campos investia contra
essa “ingênua doutrina”,
que na sua
visão fomentava a
supremacia arbitrária do
Judiciário (CAMPOS, 2001d).
O controle
judicial das leis,
portanto, era visto
como “expediente sabiamente engendrado para o fim de impedir
ou moderar as reivindicações populares”,
atacando fatalmente a
soberania popular.
Em resumo,
Campos defendia a ilimitada
soberania política do Chefe do Poder Executivo, que iria defender o povo dos
interesses escusos dos grupos que continham o espírito de facção
e o caráter
individualista do decadente
liberalismo político. Francisco Campos taxava o poder do Supremo
Tribunal como “sobrevivência do
Poder Moderador da
Monarquia”, como “resíduo
monárquico que se
enquistou nas instituições
democráticas, com o
fim de embaraçar
os seus movimentos,
naturalmente orientados no
sentido das inovações,
das experiências e
de uma concepção
criadora e liberal
da vida”, e
isso iria de
encontrar à vocação
democrática do regime
estado-novista;
Tratava-se, portanto, de não idealizar o controle de
constitucionalidade norte-americano, que
havia transformado “a
Constituição no baluarte
do conservantismo” (CAMPOS, 2001).
Campos
se ancorava em livro de pouco impacto e limitada circulação à época, de
Allen Smith, intitulado
“The Growth and
Decadence of Constitutional Government”, um
membro da corrente
progressista do pensamento
jurídico norte-americano, que
escreveu ácida crítica
à democracia americana,
publicada postumamente em
1930 (CAMPOS, 2001d).
Mais
uma vez, se verifica o uso de autores do movimento progressive legal
thought pelos pensadores
autoritários brasileiros para fundamentar a
concentração de poder
autoritária.
Enquanto
os norte-americanos muitas
vezes criticavam os
desvios do Poder
Judiciário nos Estados
Unidos – ou
seja, as anomalias
da Justiça em
um sistema democrático
–, o autoritarismo brasileiro
usava com frequência
como fundamentação e
justificava para centralizar
os Poderes da
República na Presidência
da República as
críticas do progressismo jurídico
norte-americano.
Segundo Campos,
então, “a modificação
introduzida pela Constituição
de 10 de
novembro teve por
fim repor na
Nação o controle
do Governo, submetendo-o ao juízo
do povo”. A concentração autoritária servia como modo se fazer o “governo do
povo” (CAMPOS, 2001d).
O caso,
por exemplo, do
ministro Castro Nunes
que aderiu abertamente ao regime do Estado Novo. Ainda
que se possa argumentar que suas decisões foram técnicas e ponderadas naquele
tempo (NUNES, 1943), sua aproximação
com o governo
na fase mais
dura do varguismo
foi celebrada inclusive
em seus escritos
doutrinários (NUNES, 1941).
Castrou Nunes
foi nomeado ministro
do Supremo Tribunal
em 1940 e
desde logo se
mostrou à vontade em representar os interesses do Estado Novo, afirmando
sem rodeios que “é que o crescimento do princípio da autoridade, o primado do
Executivo, é, nas democracias débeis, um produto do instinto conservador
da própria Nação”,
e sua conclusão
era de que
tais democracias “vivem
na alternativa permanente
de escolherem entre
a ditadura e
a anarquia”.
Sua justificativa consistia
que a “profundidade histórica
do fenômeno está
indicando que o presidencialismo, com a feição autoritária que só agora
lhe demos, é uma
constante de nossa
evolução constitucional”.
E que
o presidencialismo é
“unidade na direção
administrativa,
administração estável, segura
de sua róta,
coordenada nos seus
movimentos e controlada
nos seus átos
por meios adequados”,
o que significava
isolar o Poder
Executivo do jogo
político e da
influência dos partidos
políticos (NUNES, 1938).
Castro Nunes
talvez seja o
arquétipo do tipo
de juiz que
Oliveira Vianna definia
como a “Oligarquia
da Toga”, ou
seja, aquele magistrado
alinhado ao regime,
que integra um
Poder Judiciário aparelhado
pelo novo Poder
Executivo.
O escrito
enigmático de Vianna
que trata da
ideia da “Oligarquia da Toga” foi publicado pela primeira
vez em 1930 em Problemas de
política objetiva, depois
republicado em 1947
após a queda
do Estado Novo.
Tanto
Vianna quanto Castro Nunes aderiram à narrativa do governo que buscava
a todo custo
conter as “influências
do espírito de
facção”.
Isso significava que o Supremo Tribunal Federal
deveria organizar a si próprio e as demais judicaturas do país, consagrando a
imposição institucional sobre o “arbítrio”
dos diversos tipos
de oligarquia que
o Brasil estava
sujeito (VIANNA, 1947,).
No
Estado Novo[20],
havia o ideal de que a aproximação entre Executivo e Judiciário
seria o vetor
da renovação nacional.
Nesse esquema, existia
certa confusão entre as atribuições e os limites de cada um dos três poderes,
e, naturalmente, o “primado do Executivo” era sempre a expressão do tempo.
Castro Nunes
defendia que a
primazia do Poder
Executivo não era
a “negação dos outros poderes ou
a concentração nas mãos do Chefe de Estado de
todos os poderes
constitucionais”, pois o
Executivo apenas representava,
com a Constituição
de 1937, o
“poder de direção
política, com atribuições
legislativas que lhe são próprias e mais as atribuições outrora
reservadas ao Poder Moderador” (NUNES, 1943).
A discussão
sobre os rumos
do Poder Judiciário
no Estado Novo
passava por uma
série de detalhes
técnicos de organização
institucional, e uma
das pautas, que
já se arrastava
por muitas décadas,
desde a Primeira
República (SCHWAITZER, 2012 ),
era o debate
entre a forma
unitária e a
forma dualista da
jurisdição.
A chamada
Justiça Ordinária (CAVALCANTI,
1938), consagrando a
forma unitária da
jurisdição dentro do
plano estadual, dissolvendo-se a
primeira instância da
Justiça Federal. Fixou-se,
dessa maneira, a competência privativa da União para legislar sobre Direito
Civil, Direito Comercial,
Direito Aéreo, Direito
Operário, Direito Penal
e Direito Processual,
abolindo-se, então o
dualismo judiciário na
primeira instância. Castro Nunes
resumiu a questão: “um só Código, uma só justiça, esta estadual, aquele
federal” (NUNES, 1943).
A discussão
sobre a dualidade
da Justiça teve
diversos contornos e
contextos entre 1930 e 1945 e foi extensamente debatida na doutrina,
tanto na época do
Governo Provisório (NUNES,
1931) quanto na
reconstitucionalização que antecedeu
o Estado Novo
(CARNEIRO, 1934).
Em
certo sentido, a Justiça Federal não se compatibilizava com a propositura de
Estado realizada pelo autoritarismo da época, não tendo sido prevista pela
Constituição de 1937
(apenas a primeira
instância da Justiça
Federal, contudo, foi
extinta).
São ainda
hoje nebulosas as
razões pelas quais
se realizou a
anacrônica “unificação pela
estadualização” da Justiça,
que de certa forma caminhava na rota antagônica da concentração de poder
do Estado Novo (SCHWAITER, 2012).
Independentemente dos detalhes
em torno da
unificação da Justiça,
estava patente no
pensamento de Francisco
Campos a definição
categórica de “crise do nosso
Direito Judiciário”, que não seria algo apenas técnico, mas institucional, ligado
à “velha aparelhagem
judiciária” que não
estava capacitada para
alcançar as questões
daqueles dias.
Sua acusação
era a de que
o “processo em vigor, formalista e bizantino, era apenas um instrumento
das classes privilegiadas”, e
Campos ia além,
afirmando que as
elites brasileiras “tinham lazer
e recursos suficientes para acompanhar os jogos e as cerimônias
da justiça, complicados
nas suas regras,
artificiosos na sua
composição e, sobretudo,
demorados no seu
desenlace”.
Ou seja,
para Campos, do
modo como o
Judiciário estava disposto,
não seria possível
acompanhar as transformações políticas
do país e
se impunha um
novo regime de
administração da Justiça.
Sentenciava Campos:
“Responsável pelos bens públicos,
o estado não pode deixar de responder pelo maior deles, que é
precisamente a Justiça,
e à sua
organização e ao
seu processo há
de imprimir os traços da sua
autoridade” (CAMPOS, 2001b).
Francisco Campos
defendia que “à
concepção dualística do
processo haveria de substituir-se
a concepção autoritária do processo”. Dessa forma, o processo não
era mais encarado
por Campos como
“instrumento de luta
entre particulares”, mas sim como “concepção do processo como
instrumento de investigação da verdade e
de distribuição da
Justiça”.
Havia a
propaganda do regime de que as reformas judiciárias e processuais
estavam destinadas a “pôr
sob a guarda
do estado a
administração da Justiça,
subtraindo-a à discrição
dos interessados, tem
um sentido altamente
popular”.
A revolução
forense proposta por
Campos tinha por
objetivo centralizar ainda
mais a tutela
das disputas sociais,
propalando o “sentido
popular do novo sistema” (CAMPOS, 2001b).
Um manuscrito
de Oliveira Vianna
que não foi
publicado durante a
Era Vargas e
restou inédito até
1991 joga luz
sobre como os
intelectuais autoritários encaravam
o Poder Judiciário,
o Direito Constitucional e
os métodos de interpretação
jurídica. Vianna defendia que os campos do Direito Público, Constitucional e
Administrativo deveriam estar sujeitos a “critérios mais largos
e livres do que os
estritos critérios da
escola clássica de
interpretação”. Isso significava
a proposta de
uma “exegese construtiva”
(VIANNA, 1991).
A
adequação da magistratura ao regime autoritário estava calcada no artigo 177 da
Constituição de 1937, que consagrava o arbítrio do Presidente da República
para aposentar e
afastar funcionários públicos
(atingindo até mesmo ministros do Supremo Tribunal Federal)
por conveniência do regime.
O argumento
de Vianna era
o de que
se deveria seguir
no Brasil os
“fecundos critérios da
Escola de Jurisprudência Sociológica
dos modernos constitucionalistas americanos”,
a exemplo de
Holmes, Cardozo Llewellyn,
Brandeis e Frankfurter.
Ao
abandonar os clássicos da hermenêutica jurídica brasileira de Almeida Souza e
Francisco de Paula Baptista, Vianna adotava um
modo próprio de
realismo jurídico que
confiava nas inovações
– democráticas – do progressismo americano
para alicerçar sua
leitura peculiar da
“democracia autoritária” brasileira.
Partindo dos
escritos do jurista italiano Arnaldo Volpicelli[21], Vianna defendia a
“tendência moderna de afirmação do Estado
como entidade imanente
à sociedade e
não transcendente a
ela, como nos
regimes da democracia
liberal ou parlamentar” (VIANNA, 1991).
Os superpoderes
do Presidente da
República sobre os
magistrados eram definidos
como “poder de
expurgo”, em sintonia
com as modernas
tendências constitucionais, que
sacralizava o Leader, o Duce ou
o Führer como sinônimos
de progresso.
A resolução
do “problema da
obediência do funcionalismo” ao Chefe do Executivo era
vista como essencial para liderar a nação,
e atacar a
autonomia do Poder
Judiciário se encaixava
no pleno funcionamento do mecanismo de controle do
Estado (VIANNA, 1991).
Oliveira
Vianna, como se sabe, era um mestre da retórica. Ao mesmo tempo em
que fazia defesa
intransigente do fim
da independência da
magistratura e da autonomia do Poder Judiciário, colocava-se como
defensor histórico e “insuspeito” da Justiça. Vianna se portava como alguém
acima de qualquer crítica, que
poderia defender o
aparelhamento do Judiciário,
pois havia defendido no passado
sua autonomia: É lamentável
que assim seja;
mas, inevitável.
Ninguém menos
suspeito do que eu para este julgamento. Sempre fui um partidário
da independência do
Poder Judiciário, da
sua insubmissão às
influências do Poder Executivo. Em dois livros de doutrina política – “Problemas de
política objetiva” e “O idealismo
da Constituição” –
este de 1924,
aquele de 1930
– afirmei este
meu respeito à
majestade deste grande
poder humano.
Há dez
anos, em 1932,
quando membro da Comissão de Revisão da Constituição de 1891,
reunida no Itamarati
– pela passagem
da magistratura estadual
para a União,
problematizei, então, a
necessidade de esguardarmos, a
todo preço a
independência da magistratura
em face dos poderes políticos
(VIANNA, 1991)
Em resumo,
Vianna havia defendido
maior autonomia à
Justiça em seus escritos de 1924 e 1930, e agora no
endurecimento dos mecanismos de controle
do Estado Novo
sequer achava uma
incongruência defender a
sujeição do Poder
Judiciário à centralização
autoritária.
Esse texto
não foi publicado à época e é possível que sequer
tenha circulado nos meios forenses e
intelectuais. Contudo, através
desse material se
percebe algumas das
inclinações da ideologia
autoritária no campo
do Direito Constitucional, as
nuances do autoritarismo jurídico: a ideia de Vianna consistia,
inclusive, em passar a chamar
o Poder Judiciário
de Ordem Judiciária,
pervertendo realmente as
fundações da tradição
de separação dos
poderes no país
(VIANNA, 1991).
A
questão da interpretação antiformalista que
os pensadores autoritários
tentaram implantar no
direito brasileiro não
obteve o êxito
pretendido.
Apesar das
tentativas de alargar
os métodos de
interpretação jurídica através de
conceitos de “maleabilidade” e “flexibilidade”, que seriam voltados a minar as
bases formalistas que eram ligadas à tradição liberal e individualista, tal
tentativa teve sucesso
limitado.
Foram criadas
instituições corporativas (VIANNA,
1937) e se
estabeleceram jurisdições especiais
com metodologias efetivamente
novas, especialmente no
que se refere
à repressão dos
crimes políticos e
contra a segurança
nacional (BRANCO, 1940)
Talvez o
lugar onde tenha
sido possível efetivamente
aplicar o “novo”
Direito foi no
Tribunal de Segurança Nacional, que foi criado exatamente para defender
o Brasil da ameaça do comunismo (NUNES, 1943).
Sua formatação como
Justiça Especial (a
segunda criada por
Vargas, a primeira foi a Justiça
Eleitoral, criada em 1932, e a terceira foi a Justiça do Trabalho, de 1941) se
deu em 1936, e logo foi remodelada de acordo com as diretrizes
do Estado Novo.
Com a
estabilização do novo
regime, houve a
preocupação de “normalizar” o
Tribunal de Segurança
Nacional como instituição adequada à Constituição e seu
caráter de instituição permanente de
Estado. E com
isso se transformou
uma jurisdição de
exceção em instituição
judiciária (MACHADO, 1943).
De um
modo geral, a
quebra da tradição
com as leis
de segurança e
o novo modo
de encarar a
própria ideia de
jurisdição restou patente
durante todo o
percurso da Era
Vargas, seja antes ou depois do Estado Novo (NUNES, 2014).
Foi criada de
modo polêmico em
1936, a Lei
de Segurança Nacional[22] regulou
os draconianos procedimentos
para os crimes
contra a ordem
política.
Atualmente,
a Lei nº 7.170 de 1993 define os crimes contra a segurança nacional, a ordem
política e a social, e prevê que quem praticar os atos descritos na mesma, por
discordar do sistema político; ou com objetivo de obter dinheiro para
manutenção de organização clandestina ou ilícita.
Dentre
as condutas delituosas previstas na lei estão os atos de devastar, saquear,
extorquir, roubar, sequestrar, manter em cárcere privado, incendiar, depredar,
provocar explosão, praticar atentado pessoal ou atos de terrorismo.
O
artigo 20 da referida lei enumera diversos atos criminosos que quando
praticados com intuito de inconformismo político ou para obter fundos para
manter organização ilícita, são passíveis de pena de reclusão de 3 (três) a 10
(dez) anos. A pena pode ser dobrada se o resultado for lesão corporal grave, e
triplicada se resultar em morte.
O
intuito da norma é proteger a segurança nacional, mais especificamente, a
integridade territorial e a soberania nacional; o regime representativo e
democrático, a Federação e o Estado de Direito; bem como as autoridades que
representam os Poderes da União.
Com a
reforma do Tribunal
de Segurança Nacional[23] já
durante o Estado Novo, tal projeto era visto por
Francisco Campos como um “modelar aparelho
repressivo”, destinado a
combater “o fantasma
que tolhia quaisquer
iniciativas proveitosas para
o País” com
“rapidez, serenidade e
isenção de ânimo”
(CAMPOS, 2001e).
O paraibano
Raul Machado, juiz do Tribunal de Segurança Nacional,
pontificava que se podia julgar com liberdade
alicerçado em quaisquer
provas e com
“independência”: no novo
sistema de repressão judicial se colocava que não “existia palavra mais
vazia de sentido que
liberdade”, e na
verdade havia uma
alteração radical de
postura para se
julgar com rapidez
extrema os réus
(MACHADO, 1940).
Conclui-se, pois,
que o arcabouço
de repressão judicial
aos inimigos da pátria foi
apenas a parte mais destacada do projeto varguista de sujeição da Justiça.
O
Estado de Sítio está previsto nos arts. 137 a 141 da Constituição Federal de
1988: art. 137. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República
e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização
para decretar o estado de sítio nos casos de:
I -
comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a
ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa;
II -
declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira.
Parágrafo
único. O Presidente da República, ao solicitar autorização para decretar o
estado de sítio ou sua prorrogação, relatará os motivos determinantes do
pedido, devendo o Congresso Nacional decidir por maioria absoluta.
O
Estado de Sítio pode ser declarado nas seguintes situações:
1.Comoção
grave e extrema de repercussão nacional;
2.Insucesso
das medidas adotadas no Estado de Defesa;
3.Declaração
de Guerra ou resposta à agressão armada de outro país.
O
Estado de Sítio pode durar por até 30 (trinta) dias. Porém, se for declarado em
razão de guerra, pode se dar por prazo indeterminado.
Durante
o Estado de Sítio, o Poder Executivo ganha papel mais relevante que os demais
poderes (Legislativo e Judiciário), na sua declaração, devem ser indicados
quais os direitos e garantias constitucionais serão suspensos, bem como quais
as demais medidas que serão tomadas.
Dentre
as medidas de exceção que podem ser adotadas, estão as seguintes:
Proibição
de deslocamento para fora de determinada localidade;
Detenção
em prédios comuns – e não em delegacias/presídios;
Restrições
referentes à quebra de sigilos (correspondência, comunicações etc.);
Restrições
à liberdade de imprensa;
Suspensão
da liberdade de reunião e associação;
Requisição
de bens e intervenção em empresas públicas ou privadas.
O
Brasil já decretou Estado de Sítio quatro vezes, a saber:
Período
Vargas (1930-1945) - Getúlio Vargas usou este mecanismo em várias
ocasiões durante seu governo para controlar a oposição política[24].
Governo
Dutra (1946-1951) - O presidente Eurico Gaspar Dutra também usou
o estado de sítio em 1948, por exemplo, para combater movimentos comunistas e
sindicais.
Ditadura
Militar (1964-1985) - Durante o regime militar, os Atos
Institucionais funcionavam de maneira similar a um estado de sítio, dando
amplos poderes ao governo para suprimir a dissidência.
Administração
Collor (1990-1992) - Durante o governo de Fernando Collor de
Mello, houve uma tentativa frustrada de decretar estado de sítio em 1992, como
uma medida desesperada para se manter no poder em meio a um processo de impeachment.
O
estado de defesa tem alcance e duração limitados, podendo ser decretado pelo
Presidente da República para lidar com crises locais e temporárias.
O
estado de calamidade pública é a antessala do estado de defesa”. Essas foram as
palavras utilizadas pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, dando a
entender que a atual situação do Brasil poderia fazer com que o presidente Jair
Bolsonaro (sem partido) decretasse o regime excepcional do “estado de defesa”[25], um mecanismo previsto na
Constituição Federal, mas que nunca foi utilizado no país.
Na
avaliação de Cassio Casagrande apud Cerioni e Freitas, professor da
Universidade Federal Fluminense (UFF), a forma com que o PGR se manifestou dá a
entender que seria possível decretar o estado de defesa[26] em âmbito nacional, o que
não é possível. “O artigo é claro em estabelecer que ele só pode vigorar em
locais restritos e determinados. Em princípio, não é possível decretar em todo
o território”, afirma.
Além
disso, o constitucionalista pontua que não há uma definição se uma situação
pandêmica se enquadraria em uma calamidade de grandes proporções na natureza.
“Acredito que não há hipótese nenhuma para decretar o estado de defesa hoje.
Talvez se houvesse uma insurreição civil, mas não estamos vivendo isso hoje”,
completa.
Daniel
Sarmento apud Cerioni e Freitas, advogado e professor de Direito
Constitucional da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), diz que “de
modo algum” há justificativa para decretar estado de defesa no Brasil. “Se as
medidas de calamidade pública adotadas não estão surtindo todos os efeitos, em
boa parte é por culpa do próprio executivo federal, atuando de maneira
sistemática contra as medidas de saúde pública. Então, não faz nenhum sentido,
para combater o que seria a situação de calamidade pública que é a pandemia,
aumentar os poderes do Executivo, do então presidente Jair Bolsonaro”[27], disse.
O
estado de sítio tem um escopo mais amplo, requer aprovação do Congresso e é
reservado para situações de extrema gravidade nacional. Ambos restringem
direitos civis, mas o estado de sítio é mais abrangente nesse aspecto.
Segundo
a Dra. Flávia Danielle Santiago Lima, a constante afirmação da “supremacia
judicial” sobre a Constituição ou do
poder de dar a “última palavra” sobre a interpretação do seu texto – numa
manifestação aproximada ao maximalismo
judicial – também gera censuras.
É de
se destacar, todavia, que essa avaliação ocorre a partir de um conjunto de decisões polêmicas - ou seja, ativismo
imputável a determinados julgados – que gera uma conclusão inegável.
Não se
pode negar a relevância e repercussão destes julgados, de consequências por vezes inimagináveis, sobretudo pelo impacto
que as decisões do STF geram num sistema que parece se encaminhar para a concentração de
competências neste tribunal – e mais, que lhe assegura instrumentos para impô-las sobre
demais poderes e órgãos jurisdicionais.
Mas a
afirmação de que o STF é ativista, com amparo em decisões pontuais, sem a identificação de temas ou aspectos em que essa
tendência é mais forte, mais que colaborar, pode obstaculizar o debate. Compromete, ainda,
o inevitável aspecto descritivo da Teoria Constitucional, a partir do qual constrói suas
prescrições.
Há um
elemento comum entre ambas as sugestões – ativismo ou autocontenção: a possibilidade de invalidação dos atos dos
demais poderes não é aprioristicamente rejeitada.
Como
toda interação, há recuos e avanços. Convivem paradoxalmente progressos e
retrocessos. Assim, cada diagnóstico oferecido espelha uma descrição contingente. E, isto ocorre na Corte,
mas também na doutrina, cuja busca pela “categorização
de caminhos aceitáveis” para o exercício da jurisdição constitucional – sobretudo do STF - mostra a necessidade de
“adequação” da sua atuação aos parâmetros da CF/1988 e do arranjo democrático, mas tem
dificuldade de oferecer uma resposta sobre o modo em que essas exigências podem ser viabilizadas
no caso concreto.
Estando
munido om poderes ditatoriais, Getúlio prosseguiu governando[28]. O clima de insegurança
gerado pela Segunda Grande Guerra Mundial dava-lhe fortes argumentos para
afastar qualquer possibilidade de retorno à democracia.
Foi
apenas com a vitória dos aliados, aos quais ele se aliou após indecisão ao
início, que foi editada a Constituição democrática de 1945. Deixando o poder e
a ele retornando pelo voto popular em 1950, em plena democracia, não teve
Vargas maior protagonismo nas questões de Direito e Justiça.
Através
dos fatos colhidos de obras esparsas da ação de Getúlio Vargas na esfera
jurídica e judicial. Mostrou-se que a personalidade desta importante figura da
vida nacional, muito bem resumida por Luiz Octavio de Lima ao dizer: ‘”com sua
aparência pouco imponente, pouco mais de 1,60 metro de altura, gordinho, de ar
bonachão, em 1930 Getúlio Vargas já havia se acostumado e dosar gestos de
camaradagem com demonstrações de autoridade para não parecer fraco ou
manipulável”.
Em
1937, retomando poderes ditatoriais, Getúlio Vargas impôs nova Constituição, a
chamada "Polaca", por sua semelhança à então vigente na Polônia desde
1935. Escrita por Francisco Campos, ela, realmente, impôs severas limitações ao
Poder Judiciário. Além de extinguir a Justiça Federal, sem que contra isto
pudesse haver qualquer questionamento, a Carta de 1937 não incluiu o mandado de
segurança entre as garantias constitucionais, consequentemente excluindo-o do
ordenamento jurídico[29]. No art. 94 proibia-se ao
Poder Judiciário "conhecer de questões exclusivamente políticas.
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[1]
O clímax dos planos de Getúlio
Vargas, no entanto, deu-se somente em
fins de 1937, quando, de acordo com a constituição vigente, faltaria um
ano para o encerramento de seu mandato,
do qual estaria impedido de se reeleger.
Em 30 de setembro de 1937, foi encontrado documento intitulado como ‘Plano Cohen’, que continha planos de um
violento levante comunista no Brasil de natureza terrorista. Embora conhecidamente falso pelo
governo, foi utilizado como justificativa
para o cancelamento das eleições de 1938 e, consequentemente, para a
decretação de um novo Estado de Guerra e
para instauração de um regime autoritário - O Estado Novo.
[2]
A fase constitucional do governo
de Getúlio Vargas ficou marcada pela radicalização da política nacional e pelas
tentativas presidenciais de centralização do poder. O governo constitucional
foi a fase do período em que Getúlio Vargas esteve na presidência que abrangeu
os anos entre 1934 e 1937. O governo Constitucional (ou Constitucionalista)
durou de 1934 a 1937 e é considerado a segunda etapa da Era Vargas. O período
se inicia com promulgação da Constituição de 1934 e a eleição indireta de
Getúlio Vargas para presidente da República pela Assembleia Nacional
Constituinte.
[3]
GODOFREDO XAVIER DA CUNHA, filho do Dr. Felix Xavier da Cunha e D. Josefina
Pinto Bandeira, nasceu em 25 de fevereiro de 1860, na cidade de Porto Alegre,
província do Rio Grande do Sul. Descendia, pela linha paterna, de Felix da
Cunha, notável político, reorganizador do Partido Liberal Rio-Grandense, em
cuja chefia foi substituído pelo grande tribuno Gaspar Silveira Martins, e,
pelo lado materno, da família Pinto Bandeira, cujo chefe teve parte saliente na
expulsão dos castelhanos da antiga Colônia do Sacramento. Em decreto de 26
novembro de 1890, foi nomeado Juiz Federal na secção do Estado do Rio de
Janeiro; no exercício desse cargo, e pela primeira vez no país, requisitou
força federal para garantir o habeas corpus concedido aos presidentes de mesas
eleitorais de Campos, ameaçados em sua liberdade pela polícia estadual. Em
decreto de 8 de fevereiro de 1897, foi transferido para a secção do Distrito
Federal, onde foi um grande Juiz, cujas sentenças lhe granjearam forte
popularidade. Em várias vezes contrariou o governo e o povo, colocando acima de
tudo a autonomia do Poder Judiciário. Foi nomeado Ministro do Supremo Tribunal
Federal, em decreto de 18 de setembro de 1909, preenchendo a vaga ocorrida com
a aposentadoria concedida a Alberto de Seixas Martins Torres; tomou posse a 25
do referido mês.
Em fevereiro de 1927, foi
eleito Presidente do Tribunal, por ocasião do falecimento de André Cavalcanti
d’Albuquerque, havendo antes exercido o cargo de Vice-Presidente. Foi
aposentado pelo Decreto nº 19.711, de 18 de fevereiro de 1931, ato
discricionário do Chefe do Governo Provisório. Dotado de grande ilustração e
cultura jurídica, deixou esparsas, nas coleções de revistas jurídicas, cópias
de acórdãos, votos vencidos, grande número de sentenças e fundamentações,
despachos e outros trabalhos. Faleceu em 2 de agosto de 1936, na cidade do Rio
de Janeiro, sendo sepultado no Cemitério de São João Batista. Na sessão do dia
seguinte, foi homenageado pelo Ministro Edmundo Lins, Presidente, que falou em
nome da Corte, e pelo Dr. Gabriel de Rezende Passos, pelo Ministério Público
Federal.
[4]
Hermenegildo Rodrigues de Barros
(Januária, 31 de agosto de 1866 — Rio de Janeiro, 24 de setembro de 1955) foi
um jurista brasileiro. Para ocupar a vaga deixada por Canuto Saraiva (morto),
foi nomeado, em 1919, ministro do Supremo Tribunal Federal —, cargo que
exerceria até 1937, quando foi obrigado a se aposentar. Grande jurista
brasileiro, foi nomeado ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) em 1919,
para ocupar a vaga deixada por Canuto Saraiva. Exerceu o cargo até 1937, quando
se aposentou. Eleito presidente do STF em 1931, foi reeleito em 1934. Na sua
gestão foi instalado o Tribunal Superior de Justiça Eleitoral, em 20 de maio de
1932. Hermenegildo de Barros presidiu as sessões preparatórias da Assembleia
Nacional Constituinte em 1933 e 1935, e foi presidente da Constituinte de 1934.
Publicou, entre outras obras: Decisões judiciárias, Tribunal Especial, Direito
das Sucessões e Memórias do juiz mais antigo do Brasil. Hermenegildo de Barros
nunca faltou as sessões do STF. Não compareceu ao casamento da filha porque foi
marcado para a mesma hora da sessão do STF. Em 1931 foi eleito (e reeleito em
1934) presidente do tribunal. Em sua gestão foi instalado, sob sua presidência,
o Tribunal Superior de Justiça Eleitoral, em 20 de maio de 1932, órgão que seria
extinto pela Constituição de 1937 (do Estado Novo). Presidiu também as sessões
preparatórias da Assembleia Nacional Constituinte em 1933 e 1935. Foi indicado
presidente efetivo da Constituinte de 1934.Morreu no Rio de Janeiro e
encontra-se sepultado no Cemitério de São João Batista, em Botafogo, zona sul
da cidade.
[5] Edmundo Pereira Lins (Serro, 13 de
dezembro de 1863 — 10 de agosto de 1944) foi um jornalista, jurista e
magistrado brasileiro. Filho de Miguel Pereira Lins e Antônia Ferreira Campos
Lins, formou-se na Faculdade de Direito de São Paulo, em 1889. Estudou no
Seminário de Diamantina e fez o curso de Ciências Jurídicas na Faculdade de
Direito de São Paulo. Filiou-se ao Partido Republicano Paulista (PRP) em 1886,
tornando-se redator-chefe do jornal "O Movimento". Foi promotor
público em Jundiaí, depois juiz em diversas comarcas, até ser nomeado ministro
do Supremo Tribunal Federal por Venceslau Brás, em 1917, sucedendo Pedro
Antônio de Oliveira Ribeiro, e sucedido por Armando de Alencar. Foi nomeado
presidente do Supremo Tribunal Federal em 1 de abril de 1931, presidiu-o de
abril de 1931 até a aposentadoria, em novembro de 1937. Foi fundador do
Instituto Histórico-Geográfico de Minas Gerais (IHGMG), professor e diretor da
Faculdade Livre de Direito de Minas Gerais. Foi jornalista em jornais
republicanos e autor de livros de direito. Em 1935, Edmundo Lins publicou
Estudos jurídicos, trabalho que lhe valeu a medalha Teixeira de Freitas do Instituto da Ordem dos
Advogados do Brasil. Além dessa obra, escreveu Miscelânea, publicada por seus
filhos em 1938, e Reminiscências literárias,
publicada em 1941, reunindo artigos que escrevera para o Jornal do
Comércio. Edmundo Lins faleceu no Rio de
Janeiro no dia 10 de agosto de 1944.
[6]
Em 26.01.1935 - Plenário da
Câmara dos Deputados. O deputado João Simplício Alves de Carvalho (RS)
apresenta o Projeto de Lei 78/35, subscrito por mais 114 deputados, que
"define crimes contra a ordem política, contra a ordem social,
estabelecendo as respectivas penalidades e o processo competente e prescreve
normas para cassação de naturalização". Denominado "Projeto de Lei
Monstro", é recebido sob os mais vivos e veementes protestos da opinião
pública brasileira, justamente alarmada com a ameaça de tão severas e violentas
medidas. O governo tem maioria no Parlamento, e a tramitação da proposta é
rápida. Transforma-se na Lei nº 38, de 4 de abril de 1935, denominada Lei de
Segurança Nacional.
[7] O STF, nas últimas décadas, tem
expandido a sua autoridade sobre os demais órgãos do próprio Poder Judiciário
e, também, em face dos Poderes Legislativo e Executivo. Existe certa
divergência sobre as causas dessa expansão, que não é exclusividade do Brasil,
pois, enquanto que para alguns ela é consequência imediata da expansão do
sistema de mercado, uma vez que os investidores confiariam mais nos tribunais
do que em governantes demagógicos, para outros ela decorre da “retração do
sistema representativo e de sua incapacidade de cumprir as promessas de justiça
e igualdade, inerentes ao ideal democrático”.43 Há, ainda, os que enxergam esse
deslocamento de competência do sistema representativo para o judiciário como
uma consequência da adoção de constituições rígidas. Oscar Vilhena Vieira usa o
termo “supremocracia” para nominar essa expansão da autoridade do Supremo: Em
um primeiro sentido, o termo supremocracia refere-se à autoridade do Supremo em
relação às demais instâncias do judiciário (...) Assim, supremocracia diz
respeito, em primeiro lugar, à autoridade recentemente adquirida pelo Supremo
de governar jurisdicionalmente (rule) o Poder Judiciário do Brasil.
(...) Em um segundo sentido, o termo supremocracia
refere-se à expansão da autoridade do Supremo em detrimento dos demais poderes.
(...) A ampliação dos instrumentos ofertados para a jurisdição constitucional
tem levado o Supremo não apenas a exercer uma espécie de poder moderador, mas
também de responsável por emitir a última palavra sobre inúmeras questões de
natureza substantiva, ora validando e legitimando uma decisão dos órgãos
representativos, outras vezes substituindo as escolhas majoritárias”. Esse agigantamento
do STF, tanto em face dos demais órgãos do Poder Judiciário, quanto diante dos
demais Poderes, tem feito aumentar o número de processos que nele aportam. Em
2018, foram recebidos 101.497 processos no STF, dos quais 55.201 foram
distribuídos, tendo sido julgados 112.218 processos por decisões monocráticas e
14.535 em decisões colegiadas.
Os números acima e outros disponibilizados pelo STF
permitem verificar um incremento no número de decisões monocráticas, as quais,
na última década, representaram 90% de todas as decisões liminares proferidas
em controle concentrado de constitucionalidade. No outro extremo estariam as
decisões tomadas pelo plenário, as quais não chegariam, nos últimos anos, a
0,5%. O aumento do número de decisões monocráticas, aliado à adoção, pelo
Ministros do STF, de outros mecanismos com o objetivo de controlar a pauta de
julgamentos, inclusive com a utilização do pedido de vistas, fez surgir o termo
“ministrocracia” utilizado para designar a atuação individualista e
descentralizada atualmente adotada pelo STF.
[8] É
a medida de caráter excepcional e temporário que afasta a autonomia dos
estados, DF ou municípios. A intervenção só pode ocorrer nos casos e limites
estabelecidos pela Constituição Federal: quando houver coação contra o Poder Judiciário, para
garantir seu livre exercício; quando for desobedecida ordem ou decisão
judiciária; quando houver representação do procurador-geral da República. A
intervenção federal é uma medida excepcional, pois a regra é a autonomia dos entes federados. Seus
fundamentos estão previstos no texto
constitucional, que estabelece dois requisitos, um material, as situações-problema, e outro formal,
prescrições legais. Faz parte do rol de
competências privativas do Presidente da República e é uma medida
que, para os constitucionalistas,
torna-se inviável para o sistema federativo.
[9] “Na Primeira República, muitos
presidentes foram responsáveis por assassinato em massa e execução de
indivíduos”, revela. Havia uma prática conhecida como desterro, que consistia
em colocar pessoas indesejáveis (como prostitutas, alcoólatras, os chamados
vadios — nome dado à população desempregada — etc.) em navios para serem
enviados para a morte. O governo autorizava a execução a bordo ou soltava as
pessoas no meio da floresta amazônica, o que podia ser considerado como
sentença de morte devido à impossibilidade de sobreviver nas condições da
floresta. O Congresso, formado por
apoiadores dos presidentes, em decorrência da política dos governadores, era
conivente com situações como essa. “Foi uma época de muita impunidade na
República Brasileira em um período supostamente democrático. O Congresso sabia
que o presidente era responsável pelas mortes, mas não fazia nada.”
[10]
De acordo com Giorgio Agamben, o estado de exceção tem sua origem com o Decreto de 8 de julho de 1791, da
Assembleia Constituinte francesa, no qual se
distinguia o Estado de Paz (‘État de Paix’), o Estado de Guerra (‘État
de Guerre’) e o Estado de Sítio (‘État
de Siège’). Tal diferença reside que, no primeiro caso, as autoridades civis e
militares exerceriam suas funções dentro
de suas respectivas esferas de poder, enquanto no segundo, ambas buscariam agir em conjunto para coibir
a ameaça externa. Já no terceiro e último
caso previsto, excepcionalíssimo, a autoridade militar assumiria o
comando de todas as funções quando
ameaças externas provocassem desorganização da ordem interna. Embora sua origem
se dê como uma medida militar extraordinária em
função de ameaça externa, de maneira gradual o instituto desvinculou-se
até tornar-se um ato estritamente
político de cunho extraordinário, com a finalidade de reorganização
interna. A evolução do instituto, de
“estado de sítio militar” para “estado de sítio político”, garantiu-lhe um
caráter paradoxal, que reside na suspensão da lei com o objetivo de preservá-la, com a fragilização da
distinção entre “tempo de normalidade” e “tempo
de exceção”, ou seja, na busca por legalizar a suspensão da legalidade,
tornando regra a exceção. Nesse passo, cumpre apontar que, no
instituto, encontra-se implícita a ideia
de necessidade, na medida em que o estado de exceção constitui um
recurso de última instância diante de
uma situação de grave anormalidade, a qual exigiria sua execução.
[11]
O governo de Artur Bernardes sofreu forte instabilidade política gerada
pelas revoltas tenentistas contra as oligarquias dominantes e pelo avanço do
movimento operário, o que o levou a governar permanentemente em estado de
sítio. A candidatura pela quinta vez de Borges de Medeiros, líder do Partido
Republicano Rio-grandense, à presidência do estado deflagrou uma guerra civil
envolvendo a oposição no Rio Grande do Sul. A oligarquia dissidente gaúcha,
agrupada na Aliança Libertadora, contava com o apoio federal ao candidato Assis
Brasil. Borges de Medeiros, para defender sua posição, organizou os Corpos
Provisórios sob o comando de Flores da Cunha, Oswaldo Aranha e Getúlio Vargas,
entre outros, além de contratar mercenários uruguaios. Após meses de confrontos,
foi assinado um acordo entre Borges de Medeiros e Assis Brasil, em 14 de
dezembro de 1923, no qual o governo federal reconheceu Borges de Medeiros como
presidente do Rio Grande do Sul, não permitindo, entretanto, uma nova
reeleição. O movimento tenentista eclodiu, no Rio Grande do Sul, em 1923, com o
apoio da Aliança Libertadora, atingindo também Santa Catarina e Paraná. No ano
seguinte, foi a vez de parte das guarnições militares paulistas aderir ao
movimento. Depois de vários dias de combate, a cidade de São Paulo ficou sob
seu controle, após a fuga do governador Carlos Campos. A rebelião foi planejada
por militares envolvidos no golpe fracassado de 1922, entre eles o tenente
Eduardo Gomes, um dos sobreviventes dos "18 do Forte". Artur
Bernardes ordenou o bombardeio da cidade, a partir do dia 11 de julho de 1924.
A população paulista abandonou a cidade e o saldo do ataque foi de 503 mortos e
cerca de 4.800 feridos. Sem condições de resistir às pressões das tropas
legalistas, aproximadamente 3.500 revoltosos dirigiram-se ao encontro das
tropas gaúchas, lideradas por Luís Carlos Prestes e Mário Fagundes Varela. O
presidente Artur Bernardes ainda enfrentou a Coluna Prestes, formada em 1925,
sob o comando do tenente Luís Carlos Prestes, que percorreu o interior do país
durante dois anos procurando sublevar as populações contra o seu governo e as
oligarquias dominantes.
[12] Conforme um levantamento do Senado
Federal, a Primeira República Brasileira (1889–1930) esteve em estado de sítio
por 2 365 dias, equivalentes a mais de seis anos ou mais de 15% dos mandados
presidenciais. O governo de Artur Bernardes, em especial, foi passado em sua
maior parte com o estado de sítio em vigor: 1 287 dias de um quadriênio de 1
460 dias, ou 88,15% do total. O período de 25 de novembro de 1935 15 de dezembro de 1935 Getúlio Vargas Intentona
Comunista. O período de24 de novembro de 1955 fevereiro
de 1956 Nereu Ramos Garantir
a Posse de Juscelino Kubitschek.
[13] Assim, o controle difuso
caracteriza-se, principalmente, pelo fato de ser exercitável somente perante um
caso concreto a ser decidido pelo Poder Judiciário. A declaração de
inconstitucionalidade, nesse caso, é necessária para o deslinde do caso
concreto, não sendo, pois, objeto principal da ação. A Constituição de 1891,
sobre a influência do direito norte-americano, consagrou o modelo difuso de
controle constitucional, incorporando em seu texto o que já estava previsto na
Constituição provisória de 1890 e no Decreto 848/1890. Em regra, o efeito da
decisão que declara a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo é ex
tunc, ou seja, é retroativo à data da edição do ato inconstitucional. Por
exemplo, se uma lei de 2015 é julgada inconstitucional em 2020, os efeitos
retroagem ao ano de 2015 e é como se ela fosse inconstitucional desde então. Contudo, há precedentes no sentido de permitir
que o juiz ou o tribunal recorra à modulação dos efeitos da declaração de
inconstitucionalidade, que nada mais é do que optar pelo efeito ex nunc(“daqui
para frente”, a contar da data da declaração) ou até mesmo pelo efeito
pró-futuro.
[14]
A Constituição de 1937
apresentou algumas mudanças. Dentre elas, as principais foram: A Justiça
Eleitoral e os partidos políticos deixaram de existir; Os meios de comunicação
precisavam publicar e emitir notificações que dissessem respeito ao governo;
Com isso, a censura nos meios de comunicação se fez presente e foi instituída
de forma prévia; O direito à greve foi proibido; Previsão de pena de morte para
crimes políticos; As eleições foram eliminadas e só quem nomeava era o próprio
Getúlio Vargas. Em resumo, a Constituição de 1937 não foi tão democrática, em
especial quando se fala de uma participação popular.
[15]
Oliver Wendell Holmes Jr.
(Boston, 8 de março de 1841 – Washington, D.C., 6 de março de 1935) foi um
jurista, advogado, professor universitário, juiz da Suprema Corte e filósofo
estadunidense. Pai do Realismo Jurídico e conhecido como o “grande dissidente”
pela forma como teorizou e praticou o direito, influenciou o pensamento
jurídico estadunidense do século XX. Antes da Suprema Corte, atuou como
advogado, pesquisador e professor na Universidade de Harvard e, posteriormente,
foi indicado à Suprema Corte do Estado de Massachusetts. No Clube metafísico de
Boston, Holmes foi expoente, concebendo o mais famoso dos aforismas jurídicos
dos EUA - “o Direito não é lógico, mas sim experiência.” Além de suas atribuições acadêmicas, Oliver
Holmes Jr. foi e ainda é considerado um “juiz celebridade”, um grande homem,
herói do direito estadunidense e comparado a Nietzsche, por seu ceticismo
marcante. Foi o juiz mais velho a atuar na Suprema Corte até então. Serviu como
Justice até os 90 anos. Aposentou-se em 1932 e morreu por conta de uma
pneumonia em 1935.
[16] É interessante, a propósito,
registrar voto do Ministro Carlos Maximiliano, quando se discutiu, no Mandado
de Segurança nº 623, a eficácia da decisão confirmatória baixada pelo
Presidente da República em relação às questões ainda não apreciadas pelo Supremo
Tribunal Federal: “A Constituição de 1891 incorporou o Brasil ao sistema
democrático americano – o do governo de leis em vez de governo de homens; entre
nós, como nos Estados Unidos e na República Argentina, a cúpula do regime
achava-se na Côrte Suprema; por isso, os grandes presidentes da terra de
Jefferson, nas cerimônias solenes, davam a frente aos juízes do pretório
excelso, em republicana e belíssima homenagem à soberania da Justiça. Os
tribunais reviam e anulavam, aliás com discreta reserva, as leis e atos
contrários ao k espírito do código fundamental.
[17]
O positivismo comteano propunha, por meio de legislação protetora, a
incorporação do proletariado à sociedade, combate sem trégua ao liberalismo e à
democracia e elitismo político. O Exército foi o espaço onde melhor deitou suas
raízes as ideias do filósofo francês. Mas não o único, pois as elites civis do
Rio Grande do Sul também foram muito influenciadas por elas, destacando-se,
entre todos, a figura de Júlio de Castilhos, secundado por Borges de Medeiros e
toda a sua prole política – Getúlio Vargas, João Neves da Fontoura, Paim Filho,
Londolfo Collor etc. –, reunida no movimento revolucionário de 1930 (Oswaldo
Aranha, o arquiteto da revolução não nasce politicamente no ninho borgiano, mas
no de Assis Brasil, adversário de Borges).
[18]
Carl Schmitt (Plettenberg, 19 de
julho de 1888 — 7 de abril de 1985) foi um filósofo, jurista e teórico político
alemão. Membro proeminente do Partido Nazista, é considerado um dos mais
significativos e controversos especialistas em direito constitucional e
internacional do século XX. Para além dos campos do direito, sua obra abrange outros campos de estudo,
como ciência política, sociologia, teologia, filosofia política e germânica. Em
sua produção literária constam sátiras, relatos de viagens, investigações sobre
a história intelectual, além de exegeses de textos clássicos da língua alemã. Influenciado
pela teologia católica, o foco de Carl Schmitt girou sobretudo em torno de
questões relativas à temas próprios da Teoria do Estado, bem como da
materialização dos direitos e seus pressupostos filosóficos e históricos. Ele
não integra o direito comum à denominada democracia liberal, chegando a ser
chamado de "coveiro do liberalismo" e [de] "Cassandra de
Plettenberg do direito público" por um de seus contemporâneos, o jurista
alemão Günter Frankenberg. Schmitt também foi denominado de "clássico do
pensamento político" por Herfried Münkler. As mais importantes influências
sobre o seu pensamento provieram de filósofos políticos, tais como Thomas
Hobbes, Nicolau Maquiavel, Jean-Jacques Rousseau, Juan Donoso Cortés, Georges
Sorel, Vilfredo Pareto e Joseph de Maistre. A obra de Schmitt influenciou e
continua atraindo atenção de filósofos e cientistas políticos contemporâneos,
dentre eles Hannah Arendt, Walter Benjamin, Jacques Derrida, Jürgen Habermas,
Giorgio Agamben, Reinhart Koselleck, Friedrich Hayek, Chantal Mouffe, Antonio
Negri, Leo Strauss, Adrian Vermeule, e Slavoj Žižek. De acordo com a The Stanford
Encyclopedia of Philosophy, "Schmitt foi um observador perspicaz e
analista das fraquezas do constitucionalismo liberal e do cosmopolitismo
liberal. Mas pode haver pouca dúvida de que sua cura preferida acabou sendo
infinitamente pior do que a doença".
[19]
Benjamin Constant foi um militar
brasileiro que ficou conhecido por ter lutado na Guerra do Paraguai, o maior
conflito da história brasileira. Ele também foi uma das figuras mais
importantes na defesa do republicanismo no Brasil e um dos articuladores do
golpe que levou à Proclamação da República em 1889. O militar também ficou
conhecido por ser um grande educador, dedicando-se à Matemática e à Física e
trabalhando durante anos no Instituto dos Meninos Cegos, depois renomeado como
Instituto Benjamin Constant. O militar levou sequelas de uma malária que
contraiu na guerra durante sua vida e morreu em decorrência de problemas
hepáticos.
[20]
Durante o Estado Novo, o
presidente sempre reforçou a valorização do nacionalismo, nomeado em seu
governo de “brasilidade”. Essa característica era reforçada em ações do governo
como a “marcha para o oeste”, movimento de habitação e desenvolvimento do interior
do país como forma de resgatar os reais valores nacionais. Outro símbolo dessa
procura de Vargas em reforçar o nacionalismo no Brasil foi um ato em que o
presidente organizou a queima de bandeiras estaduais logo após o golpe de 1937.
O resultado das ações de reforçar o poder do Executivo e de exaltar o
nacionalismo, combatendo os regionalismos, teve como efeito prático o
enfraquecimento das oligarquias.
[21]Irmão mais velho de Luigi Volpicelli,
participou como segundo-tenente na Primeira Guerra Mundial, obtendo também uma
cruz de mérito. Formou-se primeiro em Direito em 1920 e depois em Filosofia em
1923. Aluno de Giovanni Gentile, tornou-se professor em 1925 e naquele ano
ingressou no Partido Nacional Fascista; mais tarde, foi professor primeiro nas
universidades de Urbino e Pisa e na
Universidade Sapienza de Roma de Filosofia do Direito e depois de Doutrina do
Estado. Seguidor do pensamento de Santi Romano, ele foi, com Ugo Spirito, um
teórico do "corporativismo integral". Foi diretor das revistas Nuovi
studi di diritto, economia e política (1927-33) e, com Giuseppe Bottai, do
Archivio di studi corporativi (1933-1935). Em 1938 lecionou doutrina do Estado
em Nápoles, mas em 1939 obteve uma transferência para a Universidade Sapienza
de Roma, onde foi ensinar filosofia do direito na Faculdade de Ciências
Políticas. Em novembro de 1941, quando a Segunda Guerra Mundial estourou,
Volpicelli se ofereceu como voluntário no Escritório de Prisioneiros de Guerra,
dependente da Cruz Vermelha Italiana. Em 1944, após a libertação de Roma e a
queda iminente do fascismo, ele foi submetido a um processo de expurgo pela
Comissão de Reabilitação da Universidade de Roma. Inicialmente excluído do
ensino, ele foi rapidamente reintegrado lecionando na Faculdade de Ciências
Políticas até 1967.
[22] Desde os tempos do Império do Brasil
que há legislações sobre segurança nacional. Elas foram sendo atualizadas com o
tempo até a Lei de Segurança Nacional (LSN) é a de número 7 170, de 14 de
dezembro de 1983, que define os crimes contra a segurança nacional, a ordem
política e social, além de estabelecer seu processo e julgamento. A lei passou
a ser usada com mais frequência em 2020. O Procurador-Geral da República
Augusto Aras declarou em abril de 2021 que não investigaria o presidente Jair
Bolsonaro pelo uso da Lei de Segurança Nacional contra críticos e opositores,
entendendo que ele não seria responsável pela ação de funcionários subalternos.
A Câmara dos Deputados aprovou projeto revogando a lei em maio de 2021, também
incluindo novos "crimes contra a democracia", como golpe de Estado e
interrupção das eleições, no Código Penal. Em julho, o projeto foi aprovado
pelo Senado Federal, e foi sancionado em setembro de 2021, com vetos, pela
Presidência da República. No Brasil, a legislação que dispõe sobre a Lei de
Segurança Nacional (LSN) é a de número LEI Nº 14.197, de 1º de setembro de
2021, que acrescentou o Título XII na Parte Especial do Decreto-Lei nº 2.848,
de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), relativo aos crimes contra o Estado
Democrático de Direito.
[23]
Considerada a LSN mais severa, o
Decreto-Lei n. 898/1969 manteve os preceitos norteadores da doutrina da segurança nacional
e inovou ao reintroduzir a pena de morte e de prisão perpétua, caracterizando-se por um extremo rigor
repressivo e desproporcionalidade com relação à
gravidade dos crimes cominados.
[24] O Poder Judiciário também sofreu
baques com a ditadura, sobretudo pela possibilidade de o Presidente reverter
declarações de inconstitucionalidade emanadas do Supremo Tribunal Federal,
substituindo o trabalho do Congresso Nacional.
Foram extintos os instrumentos do mandado de segurança e da ação
popular, prevendo-se censura prévia, pena de morte para crimes políticos e para
homicídio por motivo fútil ou com perversidade.
Por fim, o art. 186 da Constituição de 1937 declarava o “estado de
emergência”, que durou de 1937 a 1945. O reconhecimento desse Estado dava
espaço para que o presidente agisse com extremo autoritarismo em qualquer
âmbito da administração pública. Marcelo Novelino (2020, p. 124) assevera que:
Até 1945, o país esteve sob estado de emergência, no qual suspensas diversas
garantias constitucionais. Durante o período, os atos praticados pelo governo
eram imunes ao controle jurisdicional.
[25] Na hipótese de prisão no Estado de
Defesa, poderá ser determinada sem ordem judicial, mas deverá ser comunicada
imediatamente ao juiz, o qual poderá relaxá-la, se ilegal. A comunicação ao
juiz deverá ser acompanhada de relatório do estado físico e mental do detido no
momento da autuação. Inclusive, o preso pode pedir um exame de corpo de delito.
A ordem de prisão não poderá ser superior a dez dias, salvo se houver
determinação judicial e, em todo caso, é vedada a incomunicabilidade do preso.
[26] O
Estado de Defesa pode existir na modalidade repressiva ou preventiva. A
modalidade repressiva ocorre quando a crise já foi instaurada e o objetivo é
restabelecer a normalidade do sistema. O Estado de Defesa preventivo, por sua
vez, atua quando há apenas a ameaça de instabilidade. Diferentemente do Estado
de Sítio, o Estado de Defesa, seja repressivo ou preventivo, é restrito a
locais determinados. É aplicado apenas na localidade em que a crise acontecer.
Limitações a Direitos: No Estado de Defesa admite-se a
restrição de alguns direitos, a fim de reinstaurar a ordem. No entanto, esse
recurso só pode ser empregado quando o decreto que instituir o Estado de Defesa
assim especificar. Durante o Estado de Defesa, não podem ser editadas emendas
constitucionais (art. 60, §1º, CF). Direitos fundamentais não podem ser
suprimidos, mas podem ser restringidos, isto é, o momento de anormalidade
permite que eles se tornem menos abrangentes temporariamente.
[27] A partir de uma publicação numa coluna do Jornal “Folha de São Paulo”
intitulada “Por que torço para que Bolsonaro morra”, pela autoria do jornalista Hélio Schwartsman,
depois do presidente Bolsonaro testar positivo
para COVID-19. Conforme relata o Ministro do Superior Tribunal de
Justiça (STJ), Jorge Mussi, o
procedimento investigatório foi instaurado para “apurar supostas ofensas à
honra e à dignidade do Presidente da
República”, tendo o ministro André Mendonça argumentado em suas razões que o artigo jornalístico
continha “ofensas que podem ser enquadradas na Lei n. 7.170/1983 como crime contra a segurança
nacional, a ordem política e social, em especial na conduta tipificada no seu artigo 27
(...)”. Apesar de a publicação ser
passível de críticas, é claro que a LSN foi utilizada com fim político determinado, sendo certeira a
decisão exarada pelo magistrado de suspender o inquérito policial no Habeas Corpus n. 607.921/DF ao se
basear nos precedentes do STJ e do STF,
concluindo não ter sido possível extrair a motivação política do
jornalista, “tampouco a ameaça real ou
potencial à integridade territorial, à soberania nacional, ao regime
representativo e democrático, à
Federação ou a Estado de Direito”.
[28]
Fim do Estado Novo – Com a
deposição de Getúlio Vargas, em 1945, uma nova eleição elegeu o general Eurico
Gaspar Dutra. No ano seguinte, uma nova Constituição foi promulgada,
assegurando um estado social de direito embasado na mais ampla tradição liberal.
O princípio federativo foi recuperado, assim como o equilíbrio entre os poderes
Executivo, Legislativo e Judiciário. A Constituição declarou o voto secreto
obrigatório a todos os brasileiros maiores de dezoito anos, com algumas
exceções, como os analfabetos. Mas essa abertura democrática não duraria muito
tempo. O governo Dutra foi tumultuado por várias greves e manifestações
populares decorrentes da crise econômica. Dutra foi sucedido por Getúlio
Vargas. Dessa vez seu governo seria caracterizado por uma política populista e
nacionalista, mas Vargas perderia o apoio político e das Forças Armadas, após
uma série de greves, avanço da inflação e o atentado ao político Carlos
Lacerda, atribuído a pessoas ligadas ao presidente. Vargas respondeu com o
suicídio. Em 1955, Juscelino Kubitscheck venceu as eleições, cujo governo ficou
conhecido por seu lema “cinquenta anos de progresso em cinco anos de governo”.
Porém, da mesma forma que seus sucessores, o governo JK foi marcado por
problemas financeiros e pelo avanço da inflação.
[29] Em 03 de junho de 1936 foi
protocolado na Corte Suprema dos Estados Unidos do Brasil o habeas corpus de número 26155 pelo advogado
Heitor Lima em favor de Maria Prestes
(nome que era utilizado por Olga no país). Lima fora indicado por
Prestes para defender Olga juntamente
com Justo de Moraes e Evaristo de Morais, porém os dois últimos haviam
recusado a causa (REIS, 2014, p. 201),
sendo desconhecido o motivo. O habeas
corpus impetrado era bastante peculiar. Como não haviam sido encontrados
nos documentos recolhidos pelas forças
policiais indícios claros da participação de Olga e suas funções entre os comunistas (NUNES, 2015, p.
126), ela não seria processada junto com Prestes e os demais, restando a Vargas uma
prerrogativa do Poder Executivo, a expulsão, instituto jurídico que pode ser descrito da seguinte
forma: Trata-se de uma ilação, porquanto do mesmo modo que o Estado tem a faculdade de impedir a entrada de estrangeiro nocivo à
ordem pública interna, também lhe
assiste o direito de expulsá-lo quando estiver perturbando a tranquilidade do grupo. É, portanto, meio de defesa do
Estado (AMORIM; OLIVEIRA JÚNIOR, 2011,
p. 73). A expulsão de estrangeiro estava
prevista na Constituição de 1934 em seu artigo 113, no 15, que dispunha “A União poderá expulsar do
território nacional os estrangeiros perigosos à ordem pública ou nocivos aos interesses do País”.
Assim, mesmo sem um procedimento judicial, Olga
poderia ser expulsa do Brasil para seu país de nascimento, a Alemanha.
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